Boiando em uma piscina minúscula para uma orca Photo: Red Huber/MCT/Getty Images |
Por Mariana Dandara
Tilikum, a orca mais famosa do SeaWorld, faleceu na manhã de sexta-feira, 6. Após 33 anos de cárcere, se libertou. Tal qual os animais de qualquer espécie, Tili não merecia ter conhecido os humanos da forma como conheceu. Como dizia o ativista dos direitos animais, Gary Yourofsky, "se os animais tivessem uma religião, o diabo seria representado na forma humana".
Orcas são seres extremamente sociáveis, vivem em família na natureza. Com Tilikum não era diferente. No ano de 1983, na Islândia, quando foi capturado, ele vivia junto de outras orcas. Fazendo uso de bombas, que eram lançadas próximo aos animais na água para assustá-los e mantê-los encurralados, Tilikum foi preso por uma rede. Ele tinha cerca de 3 anos de idade.
"Capturar aquela orca foi a pior coisa que fiz na vida. Foi como tirar uma criança dos braços da mãe". Essas foram as palavras do mergulhador John Crowe no documentário Black Fish - Fúria Animal. Se a cena foi traumática para quem capturava Tilikum, imagine para ele e para as outras orcas, já adultas, que o acompanhavam - e que mesmo após terem sido libertas pelos marinheiros, permaneceram por perto, emitindo sons, desesperadas. Porém, infelizmente, o pior ainda estava por vir para Tili.
O terror do momento em que orcas são capturadas |
Após viver um ano nadando em círculos em uma piscina num zoológico marinho na Islândia, Tilikum foi vendido para o Sealand, um parque aquático no Canadá. O tanque em que ele passou a viver nesse local media 30 por 15 metros e 10 metros de profundidade - algo extremamente pequeno para um animal que pode chegar até 10 metros de comprimento. Como se não bastasse viver nesse cubículo, ele dividia o local com outras duas orcas. Chegou a ficar preso com elas por 14 horas em um tanque de metal de 8 metros de diâmetro e menos de 6 de profundidade. Tili cresceu, atingiu 5 metros, e mal podia se mexer por falta de espaço.
Tilikum era frequentemente atacado pelas duas outras orcas. A explicação era uma só: ambas eram treinadas via estímulos negativos, e eram punidas, não recebendo comida, quando erravam algum truque. A ausência de alimento gerava frustração nas orcas, que descontavam com dentadas em Tilikum.
Ele foi transferido para o Sea World, junto com outras baleias, quando, em 1991, a treinadora Keltie Byrne caiu acidentalmente na piscina das orcas em Sealand e foi morta por elas. Nootka, Haida e Tilikum pareciam querer brincar com a jovem, jogando-a de um lado para o outro e puxando-a para debaixo da água. O parque aquático então fechou as portas. Mas o inferno de Tili recomeçaria no SeaWorld.
O novo lar de Tilikum era maior, mas não deixava de ser um cárcere. Uma prisão de inocentes que tinham o oceano ao seu dispor, mas estavam condenados a uma piscina. Nessa época, o parque aquático começou a reproduzir os animais em cativeiro, devido as críticas que a captura na natureza geravam. Tilikum era o reprodutor do SeaWorld e foi pai de vários filhotes. Uma irresponsabilidade que ignorou o fato de ele ter traços de agressividade que poderiam ser passados geneticamente para os filhotes.
Vários foram os acidentes dentro do SeaWorld, não só com Tilikum, mas com outras orcas. Dentre eles, o que resultou na morte da experiente treinadora Dawn Branchaeu, morta pelo animal quando teve seu cabelo puxado por ele. Ela morreu afogada e esmagada.
O espaço circulado em vermelho
corresponde ao estacionamento
do SeaWorld. O pequeno risco
verde mostra as minúsculas
piscinas onde ficam as orcas.
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Ontem Tili se foi. Mesmo com todo o empenho dos ativistas - que, felizmente, diminuiu o número de visitantes ao parque - não foi possível libertá-lo. Ele morreu prisioneiro. Prisioneiro não só das limitações que as pequenas piscinas empunham, mas também da ignorância e do egocentrismo dos homens, que colocaram seu entretenimento acima de uma vida.
É necessário aprender com a morte de Tilikum, para que histórias como a dele parem de se repetir. É preciso que os humanos passem a ter compaixão pelos seres de outras espécies. E compaixão nada tem a ver com o fascínio por baleias, que leva pessoas a lotar parques aquáticos e aquários. Semelhante ao que acontece nos zoológicos - locais igualmente cruéis. O ato de querer se aproximar de um animal selvagem, sem considerar as consequências que essa aproximação trará a ele, não é sinal de afeto, mas de egoísmo. Visitar aquários e zoológicos para agradar a si mesmo é uma forma clara de demonstrar que desde que esteja confortável para o visitante, pouco importa se o animal vive em espaço inadequado. Sinal de compaixão é não por os pés em locais que exploram animais e lutar pela conscientização, para que um dia nenhum animal seja privado de sua liberdade.
A morte de Tilikum não pode ser em vão. Que as jaulas se esvaziem e piscinas e aquários não sejam mais cárceres de inocentes. E que Tili nos perdoe pelo que fizemos com ele.
As orcas vivem em família na natureza, retirá-las de seu habitat natural e afastá-las de seus filhotes é cruel |
* Para saber mais sobre a triste história de Tilikum e se cercar de mais motivos para não visitar aquários, assista o documentário Black Fish - Fúria Animal. Disponível no Netflix.
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